CORONAVIRUS
No fim desta epidemia far-se-ão as contas, e eventualmente vai-se aprender muito. Digo eventualmente porque o ser humano é estranho e pleno de ambivalências. O mais provável é que tudo se esqueça, e que se volte à velha e degradada rotina do pré corona.
Em primeiro lugar a
solidariedade. Hoje todo o mundo entoa hinos ao pessoal da saúde, e por todo o
mundo surgem exemplos fascinantes de voluntariado. Na verdade, fora de qualquer
crise, esses mesmos voluntários já existiam e o seu percurso de vida em nada se
alterou. Limitaram-se a ser o que sempre foram: profundamente altruístas para
com o seu semelhante e para com o planeta. Os outros, a imensa maioria
limita-se a aplaudir como sempre fizeram, desde que isso lhes dê alguma
notoriedade e possam aparecer nas redes sociais, liderando vanguardismos de
caracter mais que duvidoso, e espalhando as “fake news” do costume. Esta é a
primeira lição a tirar. Após a crise, aproveitem e mudem o vosso estilo de vida
e a vossa maneira de pensar. Sejam cidadãos cooperantes, responsáveis e não
peçam nada em troca, nem se tornem visíveis. Aprendam com cubanos e chineses,
esses “malditos comunistas” que na hora da verdade estão sempre presentes e
solidários. Lembrem aos brasileiros neste momento difícil, que o seu presidente
eleito, mandou embora uma legião de médicos cubanos, que trabalhavam nas áreas
em que os seus colegas brasileiros não queriam. Lembrem a esse idiota, quantas
pessoas nesse Brasil ficaram de repente sem assistência. Lembrem os responsáveis, pelo tremendo aumento de mortalidade infantil nessas mesmas áreas, ainda que seja só para memória futura.
Em segundo lugar as alterações
climáticas. Para quem está atento, esta epidemia já fez mais pela mudança
climática, que todos os povos juntos nos últimos 50 anos. A redução dos níveis
de poluição é absolutamente admirável. Talvez gente como Trump ou Bolsonaro
tenham de engolir a quantidade enorme de asneiras que vêm produzindo ao longo
dos tempos. Talvez ainda estejamos a tempo de salvar a Amazónia, que na verdade
não é apenas dos brasileiros, muito menos daqueles brasileiros que a têm
sistematicamente vindo a destruir. Talvez no fim disto tudo, se consiga uma
nova ordem mundial no capítulo do clima. Talvez os países comecem a acreditar
que o futuro está fundamentalmente no recurso a energias limpas. Mas cabe-nos a
nós como povo forçar estas mudanças.
A maneira como os diferentes
povos enfrentam esta epidemia diz muito do sistema político de cada região. Se
olharmos para a Europa, os sistemas de saúde são abrangentes, na maioria
estatais e apesar da solidariedade, são sempre os estados que arcam com a
responsabilidade maior dos problemas. Este tipo de estado social, faz parte de
um quadro civilizacional evoluído, onde as liberdades, direitos e garantias
estão em grande parte assegurados. Ao olhar para o outro lado do Atlantico,
vemos um Presidente a anunciar com grande pompa e nenhuma circunstância, que o
diagnóstico da doença é grátis.
Nos EUA, o sistema de saúde digno
de um estado social prácticamente não existe e o que existe serve bastante mal
a classe mais desfavorecida. A preocupação de qualquer família de nível médio
prende-se habitualmente com 3 coisas: bom seguro dentário, robustos seguros de
saúde e amealhar para mandar os filhos estudar. Em outros países das Américas
acontece o mesmo. Se calhar está na altura de pensarem que o famoso,
maravilhoso “way of life” é apenas mais uma miragem de um sistema económico que
vai acabar por falir. A própria economia, tão baseada no livre
empreendedorismo, está hoje dominada por monopólios que combatem ferozmente
esse livre empreendedorismo. São degradantes as imagens que nos chegam da
classe de pobres e dos que estão abaixo do limiar de pobreza, que existem nos
EUA. Como é criminoso o que se está a passar com o problema da habitação. Leiam
um livro sobre o assunto, publicado recentemente e que se chama “ os
destruidores de lares” (homewreckers – Aaron Glantz – publicado na Amazon). Vão
perceber que o núcleo duro do governo, tem vindo a enriquecer de uma forma
vertiginosa, usando e destruindo até às fundações o tal dito “way of life”. A
acrescentar, os milhares de famílias desalojadas, na maior parte das vezes em
bairros inteiros é de etnia afro.
Mas, no final vai haver vacinas,
com maior ou menor dificuldade vai-se ultrapassar a crise, durante dois dias
vão adorar os heróis desta guerra, e todos ou quase todos voltarão à sua
vidinha triste nas redes sociais, esquecendo que por um tempo o coronavírus,
lhes veio proporcionar uma vida familiar há tanto tempo esquecida. Talvez até
finalmente muita gente tenha conhecido os seus filhos e familiares mais
próximos. Tavez uma percentagem, ainda que pequena aproveite e mude. Isso fará
toda a diferença.
Eventualmente, haverá perguntas
que ficarão sem resposta. Eventualmente saber-se-á as origens reais desta
epidemia. Eventualmente virá a saber-se quem ganhou com este desastre. De uma
coisa estou certo. No final das contas, nada mais será igual ao que já foi. A
guerra está aí e vai ser preciso o envolvimento de cada um de nós.
Eventualmente do lado certo da barricada.
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